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Rosane
de Oliveira, nascida em 5 de agosto de 1960, é jornalista há 32 anos. Cursou Jornalismo na
PUCRS. Antes de se tornar jornalista, Rosane trabalhou em várias outras
empresas, dentre elas, do ramo de petróleo. Começou a trabalhar na área jornalística como
estagiária na Rádio Planetário, em Espumoso. Seu primeiro emprego fixo como jornalista foi em
assessoria de imprensa, trabalhou também como redatora e repórter de rádio,
repórter de jornal e editora de economia no Correio do Povo.
Trabalha no Grupo RBS desde
1992. Começou como editora de política. Após, foi assumindo mais espaços de
opinião e em 1999 começou a escrever uma coluna na Zero Hora. Atualmente, Rosane é Colunista de Política da Zero Hora,
blogueira, apresentadora do Gaúcha Atualidade na Rádio Gaúcha e comentarista no
Jornal TVCOM. Em período eleitoral, Rosane aumenta seu exercício como comentarista,
participando de programas da RBSTV, como o Jornal do Almoço, RBS Notícias e
Teledomingo.
Matheus Miranda: Como é o dia a dia do jornalista? Quais as técnicas que um bom profissional deve possuir ao longo da
carreira? Qual a ética que ele deve possuir?
Rosane de Oliveira: Eu sempre tenho a ideia de que a ética do jornalista não é diferente da
ética do cidadão. Pra mim, não existe uma ética específica do jornalista. Eu
tenho que saber que as coisas que eu faço, dentro ou fora da redação, eu tenho
que ter o mesmo cuidado com o que eu faço, ter o mesmo parâmetro, os mesmos
valores que norteiam a minha atividade de jornalista são as que norteiam a
minha vida. Assim como eu não posso inventar uma informação e publicar na
coluna, eu acho que é tão antiético fazer isso quanto eu não deixar as pessoas
passar na faixa de segurança, ou eu desrespeitar uma fila, ou seja, fazer
coisas ilegais. Para mim, a pessoa tem que ser íntegra em tudo que ela faz. Se
eu fosse doméstica, comerciante, enfim, a minha ética teria que ser a mesma, de
respeito às pessoas e de respeito a minha atividade. Como jornalista eu devo
ter uma preocupação ainda maior porque eu lido com um bem extremamente
precioso, que é a informação. E ao lidar com a informação, a gente também lida
com a honra das pessoas. Há sempre um risco e eu tenho muito essa preocupação, e
acho que todo o jornalista deve ter, que aquilo que nós publicamos, a palavra
publicada depois não tem volta, o estrago que ela pode produzir. Então eu
prefiro muitas vezes deixar de dar uma informação se eu não tiver certeza sobre
ela a jogar apenas ao vento e colocar a honra de uma pessoa no lixo. É claro
que hoje nós vivemos em um momento que com as redes sociais as coisas se
disseminam muito rápido e às vezes a gente dá informações ao vivo e depois
aquilo não se confirma. Isso me deixa muito aborrecida, quando damos uma
informação de uma fonte que tem supostamente credibilidade e depois aquilo não
se confirma e nós fomos veículos de uma informação falsa. Digo isso porque nós
lidamos com deputados, com senadores, nós lidamos com gente que dá informação e
às vezes a informação deles não é precisa. Nós temos que como jornalistas ter
muito cuidado com nossas fontes pra ter certeza que dá pra gente confiar. Porque
senão daqui a pouco nós podemos muito ser usados pelas fontes pra disseminar
uma informação falsa, pra prejudicar um adversário e na política tem muito
isto. Então o cuidado que nós temos que ter nas fontes na política é
redobrável.
Matheus Miranda: na tua opinião, achas que
as tecnologias de hoje, ou seja, todo o meio digital contribuem para um jornalismo mais eficiente e de qualidade?
Rosane de Oliveira: Em termos. Vamos primeiro falar do lado bom: a tecnologia facilitou
horrores a nossa vida. Hoje nós podemos publicar de qualquer lugar, podemos
entrar em contato com as nossas fontes de qualquer lugar do planeta, nós
transmitimos informações com rapidez, isso tudo é maravilhoso. Hoje a
tecnologia nos permite uma eleição rápida, que antigamente a gente passava uma
semana ou até dez dias contando votos e transmitindo informação pingadinha, “ah,
no último boletim fulano estava na frente”. Eu trabalhei já neste tempo, ainda
nesse tempo e isso era um horror. Então nós ganhamos muito com a tecnologia,
imagina um tempo em que não tínhamos as informações online como nós temos,
contava-se os votos de uma eleição presidencial, a informação estava lá em
Brasília, no TSE, e tinha dificuldade para passar para os estados. Eu não tenho
nem um pouco de saudade deste tempo. Agora, as redes sociais tem um lado bom,
maravilhoso, de interconexão entre as pessoas, mas ao mesmo tempo é uma cracolândia
em matéria de informação falsa, de agressividade, de ódio, esse lado eu
abomino, porque eu acho que nós devemos tratar as pessoas com respeito e essa é
umas das regras do jornalismo, e as redes sociais são um território onde as
pessoas simplesmente acham que podem dizer tudo, se agridem, se atacam, e
particularmente na política no tempo de eleição as redes sociais ficam
absolutamente insuportáveis por conta da intolerância.
Matheus Miranda: quais os maiores desafios
que os profissionais de jornalismo enfrentam ao longo da carreira?
Rosane de Oliveira: Bom, primeiro eu acho que assim, a gente está sempre no fio da navalha.
Lidar com informação é tu estar sempre com duvidas. A gente tem que fazer as
perguntas certas pra obter as respostas, nós temos que o tempo todo estar
driblando a tentativa das fontes oficiais de esconderem as informações. Nós
trabalhamos muito contra a vontade das pessoas, porque as fontes só querem que
dê as notícias boas e que se escondam as ruins e nosso papel é ver o mundo todo
e vasculhar o que está escondido embaixo do tapete. Também estar sempre atrás
desta verdade é o nosso principal desafio. Não se deixar enganar pelas fontes é
outro desafio enorme, ter informação precisa, ter informação o mais rápido
possível, ter a informação antes do concorrente, porque não adianta também tu
simplesmente ficar apurando e quando tu terminaste tua apuração, o concorrente
já deu. Então, lutamos muito contra o tempo, e ao mesmo tempo temos que fazer
essa equação, entre a rapidez que nós divulgamos as informações e a qualidade
dessa informação. Não adianta a gente dar antes e dar errado. Tem que dar o
quanto antes a informação mais precisa possível. É uma vida difícil também, não
vou enganar. Eu adoro o que faço, mas não é uma vida fácil e glamorosa como as
pessoas possam pensar. Eu trabalho duro, tenho muito suor mesmo, tem muito fim
de semana trabalhado, muita noite mal dormida, muitos pesadelos que a gente
tem, porque ficamos com medo de ter dado uma informação e não ser bem assim.
Nosso trabalho é um pouco tenso, mas eu não conheço outro mais excitante e mais
apaixonante do que este.
Matheus Miranda: o que tu achaste do fim da
obrigatoriedade do diploma para o jornalista?
Rosane de Oliveira: Eu sou a favor do diploma, ou então a gente acaba para todo mundo. Eu,
por exemplo, conheço de lei eleitoral talvez mais do que muitos advogados que
não lidam na área de direito eleitoral. Agora, eu não posso fazer uma petição,
se eu for acusada por alguma coisa, não me posso autodefender. Se tiver uma
ação minha eu tenho que contratar um advogado pra ir lá me defender. Mesmo que
eu conheça todas as leis nas quais eu preciso me basear, mesmo que eu seja
capaz de fazer sustentação oral, que eu seja capaz de fazer tudo o que um
advogado faz, se eu não posso ser advogada, sabendo tudo que um advogado faz,
porque que alguém que não é jornalista pode ocupar um lugar de jornalista? Não
sou radical nessa coisa que só quem tem diploma pode escrever. Eu acho que tem
tarefas que são de jornalistas e tem tarefas que tranquilamente outras pessoas
podem produzir. Por exemplo, Dráuzio Varella é um médico e faz uma coluna no fantástico
de medicina. Eu jamais faria uma coisa tão bem como o Dráuzio faz. Ele não
precisa ser jornalista pra fazer isto, agora quem vai editar o material, quem
vai montar os programas, pra mim tem que ser jornalista. Uma coluna política
como eu faço aqui na Zero Hora tem que ser jornalista, porque senão daqui a
pouco nós corremos o risco de começar a colocar aventureiros que vão fazer em
defesa própria, em defesa do seu negócio, tendo um interesse de terceiros por trás.
O que me parece é que as faculdades de jornalismo, às vezes, demoram muito pra
se dar conta do que o mercado esta precisando e acabam perdendo muito tempo. As
empresas contratam profissionais de outras áreas porque os jornalistas não
conseguem dar conta do recado. O que me parece é que tem que haver é uma
adaptação do currículo pra que ele seja mais focado na vida real e também nas
competências que se exigem de um profissional. Se hoje o negócio é que todo o
jornalista tem que saber fazer vídeo, tem que saber atuar em diferentes
plataformas, não adianta se ensinar como se ensinava no meu tempo, há mais de
30 anos atrás.
Matheus Miranda: na tua opinião, o que tu
acha dos profissionais de jornalismo que se abdicam da profissão para tentarem
se tornar políticos?
Rosane de Oliveira: Tu estás querendo me colocar em uma saia justa aqui, né (risos), porque
eu tive colegas de profissão que fizeram isto, mas eu não me sinto numa saia
justa porque tenho muita tranquilidade em dizer que sou contra. Eu acho que é
uma competição desigual, a pessoa passa 30 anos em uma televisão de alta
audiência, como é o caso da nossa, ou em uma rádio, ou num jornal e depois
concorrem como candidatos políticos. Eu tenho muito carinho pela profissão de
jornalista, eu acho que tem uma espécie de muro, onde tem dois lados. Nunca me passou
pela cabeça a ideia de concorrer, respeito meus colegas que fizeram isto, mas
eu não me sinto confortável, até porque assim, a gente passa anos entrevistando
as pessoas, cobrando e daqui a pouco quando passamos para o outro lado, o
ouvinte, o leitor ou o telespectador tem o direito de se perguntar: mas será
que quando esse jornalista fazia pergunta x ou comentário y ele estava fazendo
isto com o desprendimento de um jornalista ou ele estava pavimentando a
carreira política? Nós tivemos vários colegas políticos, alguns tiveram
sucesso, outros não, mas enfim, tivemos dois colegas que se elegeram senadores,
a Ana Amélia, há 4 anos atrás e o Lasier, nestas eleições. Não foi pelos belos
olhos deles e nem pelo discurso deles que se elegeram, mas sim pela visibilidade
que eles tiveram como jornalistas. Eles têm a oportunidade de provar que tem
competência agora, mas que a eleição deles foi motivada pela mega exposição que
eles tiveram disso eu não tenho duvida.
Matheus Miranda: o que tu achas da reforma
política? Qual a melhor forma: o plebiscito ou o referendo?
Rosane de Oliveira: Primeiro eu acho que a reforma política é necessária. Segundo, eu não
consigo ver um plebiscito como uma coisa viável. Como é que a gente vai perguntar,
as pessoas nem sabiam nestas eleições que tinham que votar e muitos achavam que
era eleição para prefeito. Nós vamos fazer um plebiscito e perguntar para as
pessoas detalhes, ou seja, ah, o senhor é a favor do voto distrital misto, do
voto distrital puro, por exemplo. São coisas muito complexas pra se jogar num
país e esperar que aquilo tenha uma solução efetiva. Eu penso que nós elegemos um
congresso que nos representa e é esse congresso que temos que exigir que faça a
reforma política e gosto da ideia de depois essa reforma ser referendada pelas
pessoas, pois daí eu, eleitor, vou dizer sim ou não, como se disse no referendo
das armas. Eu vou dizer se concordo com o financiamento empresarial, é sim ou
não. É mais fácil do que eu perguntar num plebiscito antes: “você acha que o
financiamento deve ser público, privado, só de pessoas físicas?”. É muito
complexo pra se resolver isso num plebiscito.
Matheus Miranda: qual a mensagem que tu
deixa aos acadêmicos do curso de jornalismo, aos iniciantes, aos que estão
encerrando o curso sobre a profissão?
Rosane de Oliveira:
Eu vou te deixar a mensagem que deixo desde que eu entrei na profissão. Eu não
conheço bom jornalista que não escreva bem, que não apure bem, que não goste de
ler. Então, a primeira coisa, jornalista tem que gostar de ler. Ler o que os
outros fazem e ler textos de qualidade, não só o que rola nas redes sociais,
porque se a pessoa passa o dia inteiro no Facebook, a informação que ela terá
será uma informação de má qualidade. O Facebook é ótimo para tua relação com
teus amigos, mas as pessoas compartilham tanta bobagem, tanta informação sem
credibilidade, que é preciso ser muito seletivo para saber o que dá para
confiar ou não. Por isso, eu acho que o papel do jornalista é um papel muito
importante e por muito tempo. Nunca houve tanta informação disponível no mundo,
e é preciso que alguém faça uma espécie de curadoria dessas informações, para
separar o joio do trigo. Sempre há expectativa de que aquilo que eu leio no
jornal, como a Zero Hora, passou por uma equipe que tem a responsabilidade com
a informação e só será publicado aquilo que foi apurado e não simplesmente o
que acontece nas redes sociais, em que as pessoas leiam qualquer coisa e
compartilham. Vou te dar um exemplo e aos alunos da Unisinos: no domingo, dia
de eleições, começou a aparecer no Facebook a informação de que o doleiro
Yousseff tinha sido assassinado, tinha sido envenenado e isso era falso. Foi
preciso que a imprensa séria, a imprensa de responsabilidade tirasse isso a
limpo. Este é o nosso papel. Jornalista tem que ter independência, porque se eu
sou jornalista de opinião, eu vou dar opinião, não vou ser imparcial, vou dar
opinião contra ou a favor de alguma coisa. Eu quero chegar num ponto que é
importante para o jornalista, na minha avaliação, que é separar muito bem a sua
convicção pessoal do seu trabalho. Por exemplo, militância e jornalismo não
combinam. Se tu queres ser jornalista, não tem que ser militante. Se tu queres
ser militante, tem que trabalhar em assessoria de deputado. Mas se quer
trabalhar em veículo, tem que ser independente. Porque se eu viver cheio de
adesivos da Luciana Genro ou do Eduardo Jorge, qual é o respeito que a Dilma ou
o Aécio vão ter por mim se eu for fazer uma entrevista com eles? Então, acho
que a gente tem que ter essa separação entre Igreja e Estado. Eu tenho minhas
convicções, eu voto como qualquer cidadão. O jornalista tem que renunciar
muitas coisas, inclusive a condição de militante.
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